sábado, 18 de julho de 2020

O Astro e a Terra

    O círculo é antigo e rege-se ininterruptamente pelo Astro: a Terra dá e a Terra tira. 
Levanta-se o sol sobre as cabeças dos de cá para um dia lhes dar leito e descanso eterno nas entranhas da Terra.
Caminham os homens debaixo dele em busca dos trabalhos, das pedras para levantar, do chão para lavrar, das estradas por onde partem e voltam sempre, em contínuo movimento de ir e vir para vida tão curta.


    Caminham as mulheres protegidas dele debaixo dos lenços , dos xailes pesados, dos mantos das vergonhas a que o mundo as obriga. Do sol se retiram os dias de Invernos frios com luz branca, cheiro a lume cruzando em fios de fumo o céu metalizado, carregado de nimbos, assustando os da Terra.
Do sol se retiram as manhãs frescas, de cheiro a sabão, erva fresca estalando sob os pés, boninas salpicando os campos como gotas de orvalho primaveril.


    Do sol também se retiram os horizontes trémulos, a terra seca em torrões, quase pedra, o odor do estrume e das palhas secas, a bênção de um ribeiro quase seco a alimentar os da Terra no Verão inclemente.
Do sol se retiram os dias calmos, plenos, seguros, de fins de tarde frios. Dias em trabalhos, a salvaguarda de outros piores que virão, as cores douradas e os rastos de aromas quentes das panelas de ferro ao lume cozinhando o Outono num fogo lento.


    Somos da Terra e logo, somos do sol. Dos elementos. Até ao céu da noite chamamos "o Astro" e ao calor "a calma". Respeito à imensidão: sabemos bem que nada somos debaixo do sol e que o vagar é preciso para que se faça dele um aliado.


    Aquecem os corações dos da Terra ao despontarem os primeiros raios de sol: chegou um amigo! Caminhamos com ele.


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